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Professor, Músico, Audiófilo, Cientista Político, Jornalista, Escritor de 1968.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Provação

Alguém já disse que só há duas maneiras objetivas de perceber como um ser humano pensa. “Diga-me o que falas e escreves e te direi quem és”. Agora, medir a quantidade de pensamento, o que um ser humano apreendeu de determinada matéria explicitada através de aulas é absolutamente impossível. Portanto, como mestres, nos encontramos em um dilema: como avaliar o que o estudante “pegou” daquilo ao qual o expusemos? Será competente aquele que, no mínimo, carregar consigo o seguinte dilema: este instrumento que eu estou usando é capaz de medir o que o estudante sabe? Obviamente, como a resposta é “não”, devemos aceitar a parcela de frustração e perceber que conseguiremos, para atingir o nosso intento, no máximo, uma aproximação.

A escrita e a fala nos aproximam, de fato, do que desejamos. Nada mais dá conta desse universo avaliativo. Para bom entendedor basta dizer que não creio nas (ditas) “avaliações objetivas”, também conhecidas como “múltipla escolha”, ou na vulgata “de cruzinha”. Essas representam a instância mais medíocre da pseudo-objetividade tecno-científica do ensino atual. Não avaliam nada, a não ser a capacidade de memorização e interpretação, sem nem arranhar a superfície daquilo que chamamos de conhecimento.

A Prova está no centro da rotina escolar. Todos têm uma tendência a menosprezar todo o resto e se concentrar apenas na Prova. “Professor, hoje tem prova?”, é uma das frases que mais ouvimos por parte de jovens desesperados no nosso dia-a-dia. “É de cruzinha?”, pergunta ele em seguida, pois é só o que passa fazendo nas malditas “semanas de provas” que muitas instituições criam para apavorar ainda mais seus pupilos. Não sabe escrever e nem quer aprender, pois percebe que não precisa muito desse recurso para passar de ano. Assim, conclui muitas etapas de sua vida escolar sem saber escrever. Quando lê é só alguma coisa que o faz obrigado pelo professor de gramática, geralmente para explicitar alguma escola literária ou pra ajudar no vestibular. Por prazer, ler, nem pensar.

E assim construímos um caráter reticente ao verdadeiro aprendizado da língua materna, inavaliável, pois não sabe se expressar de forma alguma e quando o faz, os ortodoxos não consideram o dialeto como qualificado para o entendimento das gentes cultas. No entanto, posto a uma interminável provação, é bem sucedido, passa de ano. Mas não aprendeu, não cumpriu o objetivo da escola, o primordial, aliás.

E assim que concluímos aquela semana de testagens e nervosismo, aí vem a pressa: “Professor, já corrigiu?”, “A turma foi bem?”, “Não corrigiu, quando vai entregar as provas?”, “Ah, esse professor é amarrado ...”. Não há nada que eles não façam pra fugir da provação, “pessoal, o sor não veio hoje, não vai ter prova, ooobbbaaaaaa!”, depois de feita, “corrigiu?”, “corrigiu?”, “corrigiu ...”, aí ficam apressando.

Nesse aspecto, o processo escolar virou uma neurose aguda e coletiva. O que importa é a nota, é passar de ano, e deu, pelo menos para maioria. Tudo é pro vestibular, não é pro ser humano, pro cidadão, para o conhecimento mútuo, para engrandecer a sociedade. O que importa é o dinheiro, o mercado de trabalho, o motelzinho do fim de semana, a festinha, o celularzinho novo. Não é a toa que quem dá prazer, um jogador de futebol, por exemplo, divertindo as massas em seu circo de quatro linhas, ganha milhões, e nós, apóstolos da neura, miseráveis.

A educação assim, só pode ir de mal a pior. Precisamos dotar os alunos de verdadeiras formas de expressão de sua subjetividade e aprendizado. Ensiná-los competências essenciais: a fala e a escrita, o teatro e a música, o jornalismo e o cinema. Não adianta mais querer entender linguagens vazias, silenciosas que não expressam nada. Precisamos, verdadeiramente, acabar de vez com toda essa provação sem fim.

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