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Professor, Músico, Audiófilo, Cientista Político, Jornalista, Escritor de 1968.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Conselho

A professora interrompeu a reunião para falar urgentemente com os seus colegas sobre a situação da turma em que era conselheira.

- Pessoal, eu conversei muito com eles e eles estão falando muito do senhor professor. Uns falam muito bem, outros muito mal. Eu queria pedir que tivesse mais calma com eles, eles são tão carentes, precisam de carinho ...

Interrompi bruscamente e já, indignado.

- Peraí, professora, quer dizer que o problema sou eu. Depois de todas as ofensas que eu ouvi deles ao longo do trimestre, depois de eu ter, na primeira reunião do ano, solicitado falar com os pais deles e vocês terem me ignorado, depois de eu ter poupado a direção de registrar as ocorrências e matando tudo no peito, tu me pedes mais calma ...

Estava explodindo de raiva. A reunião com os pais tinha sido um sucesso, os alunos estavam se encaminhando para a consciência de suas burradas e a profi vinha ali me acusar e dialogar mais ainda, mais e mais. Chega, eles precisavam é de limite.

- Não, professor. Eu acho que temos que ter uma estratégia conjunta para agir com a turma. Eles reclamaram muito de ti ... – lá veio ela de novo me culpando.

- Querem uma estratégia, pois bem: Tolerância zero!

- Mais aí só vai piorar, retrucou – e os colegas desataram a me olhar com olhar de reprovação e foi um bochincho e tanto.

Me senti acuado. Quer dizer que o problema sou eu? Não é a educação que eles trazem de casa que é o problema? Eu tenho que ensiná-los a se comportar?

- Vocês vão me desculpar, colegas, mas estou me sentindo pressionado. Se eu estou com raiva? Sim, sou humano. Eu não sou obrigado aturar o que eu aturo, não sou pago pra isso ...

- É pago pra isso sim, retrucou uma professora, onde já se viu? Dentro da sala de aula tudo é tua responsabilidade.

-Em nenhum momento, respondi bufando, ofendi nenhum aluno pessoalmente, como eles tantas vezes fizeram. Não está na hora de nós mudarmos, professores, não somos nós os culpados pela turma estar fracassando. E eles vão rodar em massa, já vi isso acontecer antes aqui pelos mesmos motivos. Esse grupo está desorientado. Eles têm que mudar seu comportamento primeiro ...

-Mas são só crianças.

-É, mas a terceira pessoa, que é a turma, é um monstrinho bem idiota, que nunca deveria ter nascido, respondi esgotado.

Não é possível que ainda não tivessem se convencido que a educação que aqueles alunos (não) traziam de casa é que era o problema. Os pais que precisam vir a reuniões de turmas muito indisciplinadas adoram reclamar e fofocar fora da escola, mas nunca comparecem pra nos encarar frente a frente.

Por fim uma colega de quem eu gosto muito veio me aconselhar a adotar um espelho de classe para controlá-los e eu retruquei que eles tinham que aprender a se auto-gerenciar, ainda mais uma série avançada como aquela que logo estariam fora da escola. Ela argumentou que era minha missão educá-los a se comportar bem e eu disse que me recusava a fazer isso, que era coisa da família deles.

Enfim, o que era pra ser um Conselho de Classe virou uma guerra verbal de idéias filosóficas sobre educação.

Saí mal dali. Chorei, me arrependi de ter dito certas coisas, não porque estavam erradas, mas porque talvez ali ninguém precisasse, quisesse ou pudesse ouvi-las.

A raiva virou melancolia e depois tristeza. À tarde fiquei com preguiça e não consegui mais fazer nada direito. Não é nada fácil ser professor.

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